Você pesquisa sobre problemas de saude no Google antes de marcar uma consulta médica?
83% dos brasileiros segundo pesquisa (ProTeste) pesquisam no Google sobre problemas de saude.
O oftalmologista especialista em glaucoma, Milton Jacques de Carvalho tem se surpreendido com os questionamentos aprofundados dos pacientes e o uso de termos técnicos e conhecimentos de procedimentos restritos à área médica, mas mesmo assim, muitas vezes os pacientes estão equivocados. “O discernimento é sempre do médico. O tratamento do glaucoma, por exemplo, pode ser clínico, à laser ou cirúrgico, normalmente nessa ordem, mas não necessariamente assim”. O lema cada caso é um caso se aplica em todas as áreas da saúde, principalmente no que se refere à compra pela internet. “No caso do paciente que adquire lentes de contato sem consulta, pode levar à lesão séria da córnea ou perda da visão”, alerta. O paciente que recebeu diagnóstico recente é o mais suscetível a colher informações equivocadas no Google. “Ainda que a pessoa faça a busca em sites fidedignos, a gama de informações é enorme, e dentro de uma mesma doença existem espectros grandes de gravidades”, diz Dra. Adriana Camarano, endocrinologista. E não é só o diagnóstico, o tipo de acompanhamento, o segmento de cada doença e a periodicidade do tratamento também. “O médico não é mero informante”. Ela completa que, se a informação for confiável, o médico pode ajudar a interpretá-la, entendendo melhor a necessidade de cada pessoa.
A ansiedade gerada com a informação pode ser maior se o paciente se depara na internet com algo que implica gravidade. A analista de sistemas Andréa Miranda Lima Scalioni gosta da comodidade e do imediatismo do Google. Já consultou bulas de remédios na internet e resultados de exames, mas quando sua médica informou que ela tinha alteração nos linfócitos chamada linfocitose e indicou procura de hematologista, ficou insatisfeita com os esclarecimentos dados no consultório. Ansiosa, jogou a informação no Google e levou um susto. “Os primeiros links que consultei indicavam que eu teria leucemia linfóide crônica. Quando li isso quase pirei”, conta. Até esclarecer com o especialista que o caso dela não era grave, Andréa sofreu por 20 dias. “O Google me levou a mil possibilidades ruins, confundiu e me assustou”. Amândio Soares, oncologista, diz que o diagnóstico de câncer balança toda a estrutura familiar e, não raro, os pacientes querem conhecer todos os detalhes da doença, opções terapêuticas disponíveis e podem usar o Google como responsável das tomadas de decisão. “O problema é que existem estudos científicos que ainda não foram comprovados, medicamentos ainda em estudo que são oferecidos como certos”, pondera. De acordo com ele, são muitas as variáveis a serem analisadas: se o paciente se enquadra naquela situação apresentada pelo site, se as condições clínicas dele permitem a utilização da medicação e se os benefícios dela superam os efeitos colaterais e a toxidade. Ele alerta para outro perigo, sites de leigos prometendo a cura do câncer. “Por curiosidade digite as palavras: babosa e câncer ou óleo de fígado de tubarão e câncer e veja o resultado”. A reportagem digitou. Resultado: 177 mil páginas que continham receitas, medicamentos, relatos e estudos sem embasamento científico.
O Google é referência na vida de Sandra Flores, gestora de eventos. Desde que teve angina com 99% de obstrução e implantou um stent no coração, a relação com o site de busca se tornou diária. “Antes de o médico receitar os medicamentos eu já sabia de lançamentos no exterior, queria me curar logo”, conta. Sandra acabou substituindo por conta própria o remédio receitado pelo médico por acreditar nas informações que leu nos sites. Comprou a medicação pela internet e por pouco o resultado não foi desastroso. Sandra teve a coronária obstruída novamente e precisou colocar outro stent. “Meu médico me disse depois que se não tivesse mudado a medicação teria tido resposta mais rápida e positiva”, conta. Em outra ocasião, ao invés de consultar um médico depois de descobrir uma mancha na pele, as comparou com fotos no Google e se autodiagnosticou. “Achei que não era nada, pois minha mancha era muito diferente das dos sites”, diz. Sandra estava com câncer de pele, demorou demais a tomar providências e teve que fazer uma cirurgia que talvez nem precisasse se tivesse desconfiado do que viu na tela do computador. “Depois disso resolvi maneirar”, diz.
Conectado 12 horas por dia, o publicitário Khacyos Rezende diz que o Google é a página de abertura de seu computador, e que pesquisar no site é a primeira coisa que faz ao liga-lo. Ele conta que está sempre pesquisando sobre saúde, pois tem irmã e mãe hipocondríacas. “Quero mostrar a elas alternativas de tratamentos e alertá-las sobre os perigos das medicações que elas querem tomar”, conta. Para ele mesmo, a internet só influenciou uma vez, depois de ir a um médico para tratar de insônia. “Ele me receitou um remédio tarja preta, por isso fiquei apreensivo”. Khacyos pesquisou a composição e contra-indicações, se assustou e optou por não fazer o tratamento.
PESQUISAS
• O site de informações de literatura científica, Medscape, fez pesquisa ainda em 2000 e chegou à conclusão de que, 50 milhões de americanos utilizavam a internet para informações sobre doenças.
• A revista Pediatrics da Associação Americana de Pediatria fez uma busca simulando interesse de pais apreensivos sobre Fibrose Cística. Acharam 186 mil sites sobre o assunto e avaliaram os primeiros cem. Destes, apenas 45 apresentavam a data, 40 citaram o autor, 11 solicitavam dados pessoais em garantia de privacidade e apenas 35 indicaram a necessidade de avaliação médica. Muitos deles ofereciam produtos médicos.